Gralha Azul

GRALHA-AZUL (Cyanocorax caeruleus)

Era madrugada, o sol não demoraria a nascer e a gralaha ainda estava acomodada no galho amigo onde dormira à noite, quando ouviu a batida aguda do machado e o gemido surdo do pinheiro. Lá estava o machadeiro golpeando a árvore para transformá-la em tábuas.
A gralha acordou. As pancadas repetidas pareciam repercutir em seu coração. Num momento de desespero e simpatia, partiu em vôo vertical, subiu muito além das nuvens para não ouvir mais os estertores do pinheiro amigo. Lá nas alturas, escutou uma voz cheia de ternura: – Ainda bem que as aves se revoltam com as dores alheias.

A gralha subiu ainda mais, na imensidão. Novamente a mesma voz a ela se dirigiu: – Volte avezinha bondosa, vao novamente para os pinheirais. De hoje em diante, Eu a vestirei de azul, da cor deste céu e, ao voltar ao Paraná, você vai ser minha ajudante, vai plantar os pinheirais. O pinheiro é o símbolo da fraternidade. Ao comer o pinhão, tira-lhe primeiramente a cabeça, para depois, a bicadas, abrir-lhe a casca. Nunca esquece de antes de terminar o seu repasto, enterrar alguns pinhões com a ponta para cima, já sem cabeça, para que podridão não destrua o novo pinheiro que dali nascerá. “Do pinheiro nasce a pinha, da pinha nasce o pinhão… Pinhão que alegra nossas festas, onde o regozijo barulhento é como um bando de gralhas azuis matracando nos galhos altaneiros dos pinheirais do Paraná. Seus galhos são braços abertos, permanentemente abertos, repetindo às auras que o embalam o meu convite eterno: Vinde a mim todos…”

A gralha por uns instantes atingiu as alturas. Que surpresa! Onde seus olhos conseguiam ver o seu próprio corpo, observou que estava todo azul. Somente ao redor da cabeça, onde não enxergava, continuou preto. Sim preto, porque ela é um corvídeo. Ao ver a beleza de suas penas da cor do céu, voltou célere para os pinheirais. Tão alegre ficou que seu canto passou a ser um verdadeiro alarido que mais parece com vozes de crianças brincando.

A Gralha-azul é um membro da família dos Corvídeos, que são aves com ampla distribuição geográfica, que ocorrem principalmente em regiões de clima temperado.

No Brasil, esta espécie é encontrada na área que atinge do Estado de São Paulo até o Rio Grande do Sul. E uma ave de médio porte (39 cm de comprimento) e de aspecto robusto.

O corpo tem coloração azul reluzente; a cabeça, a garganta e o peito são negros, com as penas da fronte arrepiadas. Seus olhos são escuros. A coloração da plumagem é semelhante, tanto na fêmea como no macho.Habitante de florestas, ocorre principalmente nas áreas de floresta com araucária.

No Estado do Paraná, a Gralha-azul é oficialmente reconhecida como ave-símbolo, por intermédio da Lei nro. 7957, de novembro de 1984. Embora cientificamente não comprovado, muitas pessoas acreditam que a Gralha-azul “planta o pinhão” (semente do pinheiro). Na verdade, esta ave é considerada um agente dispersor em potencial das sementes do pinheiro.

Durante a atividade de alimentação as gralhas transportam o pinhão de uma árvore para a outra, deixando muitas vezes cair a semente ao chão, a qual penetra no solo devido ao impacto da queda, vindo a germinar postenormente. Entretanto, esta espécie de ave não é totalmente dependente das matas de araucária, apesar de suas relações com o pinheiro.

Sua área de distribuição abrange também os domínios da Floresta Atlântica. Apesar de facilmente encontrada em sua área de ocorrência, a Gralha-azul leva hoje o status de vulnerável, principalmente devido à destruição de seu habitat natural. No Estado do Paraná, sua principal área de ocorrência atual, restam, hoje, cerca de 3% de sua cobertura vegetacional original, reduzindo drasticamente as populações de Gralha-azul.

Fonte: ROBERTO BÓÇON Biólogo – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMAPR


A LENDA DA GRALHA AZUL

Os pinhais do Paraná são muito valiosos, porque formam, às vezes, grandes florestas só de pinheiros, como se tivessem sido plantadas pelo homem. Isso facilita o seu aproveitamento industrial. Durante muito tempo, não se soube explicar como os pinheiros apareciam em grupos, em pontos afastados, sem que ninguém os plantasse.

Hoje, se sabe que este misterioso reflorestamento é obra de um pássaro ? a gralha azul. Essa ave, que é encontrada nos planaltos paranaenses, alimenta-se de pinhões, sementes de pinheiro. Para isso, descasca-os e come-lhes a polpa gostosa e nutritiva.

Mas a gralha azul é uma ave esperta e previdente. Por isso, depois de saciar sua fome, enterra, em diferentes lugares, uma certa quantidade de pinhões, para serem comidos mais tarde, quando terminada a safra das pinhas, frutos do pinheiro. Nem todos os pinhões enterrados são comidos. Algumas gralhas morrem, outras esquecem onde enterraram os pinhões.Essas sementes esquecidas germinam e produzem grandes pinheiros.

Uma particularidade interessante é que a gralha azul enterra o pinhão com a extremidade mais fina para cima, para favorecer o desenvolvimento do broto. Além disso tira a cabeça do pinhão, porque ela apodrece no contato com a terra e arrasta à podridão no fruto todo.

Tudo isso fez nascer a lenda de que a gralha azul é um animal maravilhoso, criado para proteger os pinhais. E por isso, as espingardas dos caçadores negam fogo ou explodem, sem atirar, quando eles as apontam para a gralha azul.

Fonte: Lendas e Mitos do Brasil – Theobaldo Miranda Santos